22.3.16

TERRA DE NÉVOA


No Inverno a minha amada
está com os bichos na mata.
Que eu tenho de voltar antes do dia,
a raposa sabe-o e ri.
Tremem tanto estas nuvens! E
na minha gola de neve cai
uma cama de gelo quebrado.

No Inverno a minha amada
é uma árvore entre as árvores e
convida aos belos ramos
os corvos abandonados da sorte. Sabe
que o vento, ao anoitecer, lhe levanta o
vestido hirto de noite e geada,
e me leva para casa.

No Inverno a minha amada
Vai silenciosa com os peixes.
Servindo as águas, movidas adentro
pelo o fio das barbatanas,
eu fico na margem e vejo-a
mergulhar e revirar,
enquanto os gelos não me expulsam.

E de novo, ao embate do grito
da ave que me ampara
com a asa, desabo
num campo aberto: a amada depena
as galinhas e atira-me
uma clavícula branca. Ponho-a ao pescoço
e afasto-me por entre a penugem amarga.

Infiel é a minha amada,
eu sei que às vezes flutua
de saltos altos até à cidade,
beija nos bares com a palhinha
os copos profundamente na boca
e vêm-lhe palavras para todos.
Mas eu não percebo o idioma.

Vi terra de névoa.
Comi coração de névoa.


Ingeborg Bachmann

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